Oficina CEER
 27-07-2011
UN MATERIAL MÁGICO

Esta nanoestrutura de carbono, com a espessura de apenas um átomo mas de enorme resistência, vai permitir criar desde computadores ultra-rápidos a aplicações dignas de Harry Potter.

Num futuro não muito distante, o grafeno irá transformar as nossas roupas, as janelas dos edifícios, a chapa dos automóveis ou mesmo uma simples folha de papel em versáteis dispositivos electrónicos. Devido às suas extraordinárias propriedades, são cada vez mais os investigadores convencidos de que a próxima revolução tecnológica poderá articular-se em redor do novo e prodigioso material.

Em 1947, o físico canadiano Philip Russell Wallace foi responsável pelo primeiro estudo teórico sobre as potenciais aplicações do grafeno. Todavia, a descoberta experimental só se produziu em 2004, graças a dois físicos da Universidade de Manchester (Reino Unido), André Geim e Konstantin Novoselov.

A questão era que o grafeno, tal como se conhecia até então, parecia demasiado instável para poder ser encontrado na natureza. Os dois cientistas, de origem russa, que foram galardoados com o Prémio Nobel da Física em 2010 pelos seus estudos, demonstraram o oposto, com um método tão invulgar quanto engenhoso. Com muita paciência e fita-cola, conseguiram isolar o composto ao libertá-lo da grafite da mina de um lápis. Depois, transferiram o material para uma lâmina de silício. Trata-se, na realidade, de uma das estruturas mais simples que se pode imaginar. "É, simplesmente, uma camada bidimensional de átomos de carbono organizados de forma hexagonal", explica o espanhol Tomás Palácios, investigador do Departamento de Engenharia Eléctrica e Ciência Computacional do Instituto Tecnológico do Massachusetts (MIT) desde 2006, e que também inventou, há um par de anos, um chip de grafeno. Agora, pensa que é possível utilizá-lo para criar detectores de luz de enorme eficácia, pois serve igualmente para localizar fotões.

O grafeno apresenta uma configuração ultrafina em que cada átomo está ligado a outro através de ligações covalentes (partilham um par de electrões), formando uma rede hexagonal semelhante ao padrão do favo de mel. O resultado possui características eléctricas, ópticas, mecânicas e térmicas únicas.

Além de ser o material mais fino descoberto até agora, é transparente: para poder ser detectado, é preciso colocá-lo sobre uma finíssima placa de óxido de silício. Desse modo, é possível criar interferências de luz para mostrar onde se encontram os fragmentos de grafeno. Apesar disso, porém, é a substância mais resistente que se conhece. "É mesmo mais resistente do que o melhor dos metais; é mais forte do que o aço", sublinha Palacios. Na opinião deste especialista, o grafeno poderia inclusivamente ser utilizado para acrescentar resistência mecânica a outros compostos. A hipótese é partilhada, por exemplo, por Nuno Peres, professor do Departamento de Física da Universidade do Minho, que afirma que o material irá "trazer maior resistência e flexibilidade" a monitores como os ecrãs tácteis para computadores e telemóveis. À resistência e flexibilidade do grafeno, soma-se ainda o facto de ele ser inerte e impermeável, de apresentar uma elevada condutividade eléctrica e de poder ser trabalhado à temperatura ambiente.
O grupo coordenado por James Hone, do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Columbia (Nova Iorque), efectuou uma série de ensaios que confirmam que o grafeno é, até agora, o material mais forte alguma vez medido: cerca de 200 vezes mais forte do que o aço estrutural. "Seria necessário colocar um elefante em equilíbrio sobre a ponta de um lápis para conseguir que conseguisse perfurar uma simples folha de grafeno", sublinha Hone.

Parece perfeito e, no entanto, ainda pode ser melhorado. Uma equipa de investigadores do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia norte-americano (NIST) demonstrou, recentemente, que duas folhas de grafeno conseguem ser ainda mais eficazes como condutores de electricidade. Na prática, o fenómeno significa que o grafeno poderá ser aplicado em dispositivos electrónicos muito antes do que se pensava.

Os avanços neste campo estão a produzir-se muito rapidamente. Os peritos do NIST também descobriram que pequenas imperfeições que surgem de forma natural no nanomaterial, devido ao movimento dos átomos de carbono, aumentam a capacidade de condutividade eléctrica, o que poderá ser aproveitado para criar processadores muito mais rápidos do que os actuais. Para mais, será também possível induzir o aparecimento dessas deficiências, tal como se faz nos transístores.

PROPRIEDADES ASSOMBROSAS
A cerca de 1200 quilómetros da sede do NIST, em Gaithersburg (Maryland), cientistas da Universidade do Illinois descobriram que o material possui uma extraordinária capacidade para arrefecer quando está muito quente (ou seja, auto-refrigera), o que permite deduzir que os futuros dispositivos electrónicos que o incorporem necessitarão de menos energia. Por sua vez, André Geim já demonstrou que as correntes de electrões podem magnetizar o grafeno. Essa descoberta, publicada na revista Science, abre caminho ao desenvolvimento da chamada "spintrónica", um conceito que reúne um punhado de tecnologias emergentes cujo objectivo é explorar tanto o spin dos electrões como a sua carga. Nas palavras do próprio Geim, "a conversão da electricidade em magnetismo, ou vice-versa, é o Santo Craal da spintrónica".

No que todos os especialistas estão de acordo é que este material poderá vir a transformar toda a indústria dos transístores, os componentes básicos dos computadores. "A velocidade dos electrões determina a velocidade do transístor e, no grafeno, estes deslocam-se até cem vezes mais depressa do que no silício", indica Tomás Palácios. No mesmo sentido, Tze-Chiang Chen, vice-presidente do Departamento de Ciência e Tecnologia da IBM, assinala que "o grafeno poderá ser utilizado para produzir dispositivos electrónicos ultra-eficientes e circuitos integrados muito mais avançados do que os actuais". De facto, em 2010, a companhia fabricou um ch/p com base neste material que podia operar a uma frequência de 100 GHz, mais do dobro de um de silício. Já este ano, Yu-Ming Lin e Phaedon Avouris, dois peritos em nanotecnologia da mesma empresa, anunciaram na Nature o desenvolvimento de um transístor de grafeno ainda mais pequeno e rápido, capaz de alcançar 155 CHz. As equipas da IBM e do MIT estão convencidas de que será possível chegar ao terahertz com esta tecnologia, isto é, atingir uma velocidade quase dez vezes superior.

COMPUTADORES POR TODO O LADO
O desenvolvimento destes protótipos também permitiu demonstrar que o novo material não só poderá servir para criar chips mais rápidos como para miniaturizar os que se fabricam actualmente. Agora, a Intel produz transístores de 32 nanómetros. No final deste ano, deverá lançar outro modelo, denominado Ivy Bridge, de 22 nanómetros.

Todavia, estima-se que eles poderão ser reduzidos até aos cinco ou seis nanómetros com recurso ao grafeno. Teoricamente, o grafeno pode ser instalado, sem perder as suas propriedades, sobre qualquer superfície, mesmo que se dobre ou enrole, como se fosse uma folha de papel. Porém, onde irão buscar energia os nanocomponentes que o integram? A resposta reside na capacidade do material para absorvê-la. No final de 2010, a companhia norte-americana Nanotek Instruments anunciou que os seus técnicos tinham concebido um supercondensador baseado em grafeno que armazena tanta energia como uma bateria de níquel-hidreto metálico e pode ser carregado em segundos. No futuro, os dispositivos móveis, como as câmaras, os computadores ou os telemóveis, poderão aproveitar essa qualidade para se abastecerem de electricidade quase instantaneamente. Nas palavras de Nuno Peres (que trabalha, desde 2005, com os físicos laureados com o Nobel, em conjunto com João Lopes dos Santos, da Universidade do Porto, e Eduardo Castro, investigador em Madrid), as múltiplas aplicações do grafeno, como "o transístor mais rápido alguma vez produzido, o desenvolvimento de sensores para quantidades muito pequenas de moléculas no ar, ou os detectores de radiação e de metais em controlos de aeroportos", assim como "as aplicações em bioquímica e medicina, por permitirem um novo método de sequenciação do ADN, vão ter impacto muito em breve". No futuro, é mesmo possível que utilizemos o material em coisas que, agora, nem conseguimos imaginar. No entanto, há algo em que todos os especialistas estão de acordo: mais cedo ou mais tarde, o grafeno vai mudar por completo a nossa tecnologia.

Fonte:http://www.uminho.pt